quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Soulmates – ‘bout hapiness & mismatch

Sábado. Sol. Sossego. Saía de casa e ia pro lar. Subia a rua e paralisava. Ser. Sozinho. Só ele. Soulmate.
O que duas linhas podem descrever? Eu não sei. Mas duvido que o que eu senti naquele momento caiba em tão poucas combinações. Duvido que caiba em outra pessoa, ou em várias outras. Coube em melodias.
A noite anterior previa algo especial. No concerto, esperava como que ansiosa para acabar – mas não eu, que queria parar no tempo. Mal sabia da minha recompensa no próximo dia ensolarado. Era sábado.
Eu tinha um destino: voltar para casa. No começo do percurso, parei em uma esquina. Fitei, fitava. Lá estava uma parte de mim, do outro lado da rua. Lá estava quem me cantara a noite inteira. Ele me viu e sorriu. Encontrei abrigo, mais que isso, um lar. Um instante e eu já não estava mais.
Nunca soube como é possível duas pessoas se entenderem sem se conhecer. Só senti. Eu sei, existe um elo entre algumas pessoas. Percebi no momento e tive certeza tempos depois, com um recorte de jornal (§7). Não é loucura – ou talvez seja -, existimos,
Nós.

sábado, 23 de outubro de 2010

Enquanto a cidade dorme

Pode ser para comer o famoso lanche de mortadela ou comprar especiarias para um prato exótico, abastecer a despensa de casa ou toda a cozinha de um restaurante. Seja uma visita turística, uma parada para vislumbrar a arquitetura do século passado ou apenas um ato cotidiano de um morador das proximidades. Por um motivo ou por outro o fato é que o Mercado Municipal de São Paulo recebe cerca de 14 mil visitantes diariamente. O que vão encontrar muitos já sabem ou podem imaginar, mas como tudo estava lá desde sua abertura, às 6 horas da manhã, tão organizado para servir a todos? Poucos conseguem responder.

Essa etapa é parte da São Paulo que ninguém vê, mas faz da cidade singular e permite a tradicional variedade e eficiência dos serviços prestados. Funcionários se reúnem toda madrugada para o comércio atacadista, mantendo os 275 boxes do local sempre cheios de produtos frescos e em quantidade suficiente para a clientela. Caminhões e caixas ocupam todo o estacionamento e arredores do mercado e quem andar por lá distraído corre o risco de esbarrar em pesados carros de frutas e legumes, ou ainda em alguém carregando grandes pedaços de carne. Há também quem jogue conversa fora, tire um cochilo ou coma um lanche, agindo naturalmente em meio aquele mundo que poucos conhecem de perto, mas que é, para muitos, apenas mais um dia de trabalho.

É o que bem sabe Adelmir João Alves, o Duda, que chega ao serviço às cinco horas. Ele trabalha há vinte e dois anos no mercado e por muito tempo chegou por volta das três horas da manhã: “Acostumamos a viver com o dia começando mais cedo, quem é feirante sabe como é isso, é outra realidade.” Há doze anos Duda passou a trabalhar na banca do Ramon, pertencente desde a inauguração do mercado à família Abdala, que veio da Síria no início do século passado.

Em 1933, na inauguração do Mercado Municipal, São Paulo era uma cidade de um milhão de habitantes. Hoje a região metropolitana conta com quase dez milhões de pessoas, o que explica a gigantesca movimentação de 350 toneladas de alimentos diariamente. Ainda assim, na região metropolitana de São Paulo as feiras livres continuam sendo as maiores distribuidoras de produtos hortícolas, embora se perceba uma notável queda em seu papel abastecedor.

De fato, observa-se que, enquanto em 1983 as feiras livres chegavam a corresponder por 48,4% do escoamento da tonelagem global comercializada na CEAGESP - Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo, na década seguinte sua participação foi reduzida para 28%. Para Duda, isso acontece porque “hoje, o movimento é muito menor do que antigamente. Atualmente, São Paulo tem várias opções e o público é mais exigente.”

Juliana dos Santos, 32 anos, compartilha a mesma opinião. Filha do proprietário da Charutaria Bruno Ltda., a única tabacaria do estabelecimento, disse que desde que a família Santos comprou o comércio, há 17 anos (ele já existia desde o início do mercado), algumas coisas mudaram no municipal. As pessoas costumavam ir em busca de frutas e verduras, mas agora muitos vão a procura de quitutes, como os tradicionais sanduíches de mortadela e os pastéis de bacalhau. “O número de supermercados aumentou na cidade, então as pessoas podem comprar em outros lugares”, explica Juliana. De acordo com a comerciante, o lugar se tornou um ponto turístico: “Alguns vem observar a arquitetura do mercado, outros já estão por perto e passam para almoçar.”

Pode ser que os clientes já não sejam os mesmos e não busquem mais as mesmas coisas, mas o mercado continua sempre lá, com suas portas abertas todo dia, à espera do chão ser sujo, do ambiente tumultuado, do silêncio quebrado. Para isso ser possível, prosseguem seus homens durante a madrugada. Como esses trabalhadores, existem muitos outros que passam longas horas embaixo de um céu sem sol, para deixar amanhecer como conhecemos. São despercebidos pela maioria, mas têm um valor inestimável para uma cidade que finge não dormir. Ao final do dia, tem sempre alguém que começa tudo de novo.

*Trabalho de Fotojornalismo. Créditos adicionais: Renata Zanquetta, Sérgio Atieh e Thaís Santana.

domingo, 17 de outubro de 2010

Homesick

Não tinha teto, não tinha nada. Desde pequena, sentia que não estava em casa, sua mãe achava muito estranho. De fato, nunca esteve. Não lembro bem como nem quando aconteceu, mas em algum momento ela mudou de cidade. Não gostou. Os anos não foram amigos, mas se adaptou. Achou um bom lugar: tinha uma praça só pra ela. Finalmente!, pensou. Quis cores e prateleiras, mas percebeu que não tinha direito, lá não era e não seria seu. Foi pra longe e sentiu muita saudade da janela antiga. Aos poucos, nem lá, nem cá, não se encaixava. Morava sempre de favores. Os livros formavam pilhas e, sobre eles, a poeira. O clima nem sempre era agradável, o sono não era leve e a vida começou a mostrar um caminho de pedras. A menina era seu próprio lar. Era de todo lugar; de qualquer lugar, de lugar nenhum.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

O homem que inventaria o circo

A vida mambembe de um palhaço apaixonado pela arte circense.

Ao passar pelas luzes da entrada, frente a crianças de todas as idades e nem sempre novas, sob a lona colorida, é que se chega ao picadeiro. Do ponto central do circo, pode-se ver uma meia lua de expressões que variam de sorrisos ansiosos a abraços tímidos em busca de proteção. No círculo de cores e luzes, todos vão em busca de alegria. Em pouco tempo se escuta as boas vindas e, senhoras e senhores, o espetáculo vai começar! É nesse momento que os olhares percebem o palhaço, e este fita de volta a platéia curiosa. Com o rosto destacado pela maquiagem habitual e vestido de apetrechos chamativos, é conhecido como Matraca. Mas, embaixo dessa superfície estão as marcas do longo tempo dedicado a vida mambembe de Celso Stevanovich.

Seus cabelos já são grisalhos, e a mania de fazer graça marca o rosto, mas preserva o corpo e o espírito de um homem de quarenta e sete anos. O sotaque hermano não deixa despercebido de onde veio, e acrescenta à lista saudosa de quem não para em um lugar só. Apaixonado pela profissão, Stevanovich vive do e para o circo. Seguidor da tradição familiar, ele faz parte da quarta geração de circenses. Suas influências são nomes de peso como Charles Chaplin, Kiton, Jerry Lewis e Oleg Popov, mas seus verdadeiros professores foram seu tio Cepillo e seu primo Pipico, ambos palhaços musicais. Seu início se deu no antigo Circo Imperial, em seu país de origem, a Argentina, em 1979. De lá, para o mundo.

Há quinze anos, Celso pode ser encontrado no Mundo Mágico de Beto Carrero, juntamente com sua esposa e seu filho, companheiros da prática itinerante. Ele já exerceu muitas funções no espetáculo: foi trapezista; domador; animador; malabarista; equilibrista e, por fim e sempre, palhaço. “Tudo menos dono de circo”, brinca ao resumir a extensa lista. Para tanta habilidade, é preciso treinar todo dia, cerca de duas a três horas. Se a apresentação é nova, mais dedicação ainda. Muitas idéias do espetáculo são sugestões próprias, mas, humildemente, explica que “quase tudo já foi inventado, é só reciclar.”

Durante a semana, os artistas acordam tarde, almoçam, ensaiam antes ou depois do espetáculo. Mas a rotina não é feita só da labuta. A segunda feira é o dia sagrado de descanso e sempre rende um jogo de futebol ou churrasco. De acordo com Celso, uma das coisas boas de morar na estrada é que se conhece muitas pessoas e lugares. Mas nem tudo é doce, “o ruim é que é preciso viajar para ver sua família e amigos”, lamenta o artista. Com o tempo, se acostuma com as saudades e toma gosto pela prática e manias do circo.

Celso nunca entra no picadeiro se não for para se apresentar ou ensaiar e não se senta nos caixotes dando costas à arena. Sua fala arrastada carrega um vasto vocabulário de gírias próprias da arte e não resiste ao ditado: “quem bebe da lona do circo, nunca deixa de ser cirqueiro.” O palhaço bem sabe quão verdadeiras são essas palavras: “Existe uma diferença entre quem é de circo e quem gosta disso e quer ser cirqueiro. Quem é nascido em circo, o vê como sua casa e quem gosta de circo fica um pouco, mas sempre pensa na casa onde mora.”

Ao final do espetáculo, as luzes já querem se apagar e a música quer se guardar para o outro dia. A pintura da face já está borrada pelo suor, a platéia não é mais ansiosa nem tímida, mas alegre. Quando o esforço dos integrantes é reconhecido, uma salva de palmas ecoa pelo brinquedo de lona. O palhaço se emociona satisfeito pelo trabalho e não pensa em outra profissão: “Quero continuar trabalhando no picadeiro até os últimos dias de minha vida”. E completa orgulhoso: “Se não existisse o circo, eu o inventava!”

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Chega de saudade

"Era ainda jovem demais para saber que a memória do coração elimina as más lembranças e enaltece as boas, e que graças a este artifício conseguimos suportar o passado." - Gabriel Garcia Márquez
Você já tem alguns anos ou algumas décadas e poucos amigos. Uma coleção de rostos conhecidos. A verdade é que deles o sabido é insuficiente, e a nostalgia engana. Não chega a ser saudade, mas sim uma vontade de viver aquela época novamente – o que são, sim, duas coisas bem diferentes. É preciso deixar as pessoas irem, assim como virem e voltarem, em seu tempo, a todo tempo. Chega de não-sentir tanta saudade e a declamar a qualquer um como fazemos aos amigos de infância, às pessoas com quem convive, a quem se ama. Façamos jus a estes últimos e admitamos quando for pura incapacidade de seguir em frente, de aceitar a mudança, de refazer a mente. A lembrança reconstrói os fatos de uma forma sempre mais amena, sutil e doce. Pois então, façamos isso com o presente e reconheçamos os momentos verdadeiros, as dores fiéis e os amores de fato únicos. Deixemos de lado essa manifestação bit-amigável, que faz de todos nós populares. Deixemos as saídas que nunca acontecerão, as pessoas que nunca foram e nunca serão. É preciso abrir mão, ser apenas vão, guardar o que realmente foi, e que seja bonito sem precisar do tempo pra enfeitar.

domingo, 22 de agosto de 2010

Um poema de harmonias suaves

O céu estava bem azul
E o mar rugia ao sul
E me deixava maravilhado
Com o galho orvalhado
De perfil no céu anil
Onde o sabiá gentil
Assobiava um samba a mil
Jean Jacques-Sempé, ou apenas Sempé, é um cartunista francês famoso por seus personagens infantis tais como Le Petit Nicolas (BR: O Pequeno Nicolau) e Marcellin Caillou (BR: Marcelino Pedregulho). Seus traços, assim como as histórias por eles contadas, são sempre sutis e dignos de um olhar atento aos detalhes.

Delicadeza é a marca registrada dessa importante figura, que quando criança foi expulso do colégio por ser “distraído e indisciplinado” e mais tarde também do exército por desenhar nas horas em que deveria estar de guarda.

Não sei como poderia gostar mais dos ajustes que a vida fez a ele. Após alguns sufocos, Sempé passou a ter visibilidade. Conhecia-o por seus trabalhos publicados na New Yorker, e por isso, nas consecutivas capas da piauí também. Certo dia, passei pela Editora Martins Fontes e comprei, muito alegremente, um livro pequenino da série O Pequeno Nicolau.

Essas poucas páginas me renderam um passeio pelo mundo infantil há muito tempo não visitado por mim, a não ser pelos momentos passados com os pequenos irmãos, e digo que me diverti como se fosse um deles. Confesso que perdi a exibição do filme no Festival Varilux de Cinema Francês, mas apenas o trailer já me deu uma idéia de que deve ser bom.



Apesar de essa ser a história – acredito eu – mais conhecida do ilustrador, e conter muito de sua infância, Sempé certa vez disse que seu personagem para crianças é Marcelino Pedregulho. Hoje, em pouquíssimo tempo, pude me deliciar com a edição publicada pela Cosac Naify, em grossas folhas Garda Pat Kiara 135g/m², 40 anos após a saída na França.

Com poucas palavras e belas imagens, o livro remete a um garoto esquisitinho que ruborizava, assim, sem mais nem menos. Para ele, era normal, mas cansado tentar explicar-se toda vez, se afasta das pessoas. Até conhecer Renê Rocha, um menino tão esquisito quanto ele. Entre tantas alergias, surge uma amizade bonita e é principalmente sobre isso que a história fala: amizade. Daquelas que só mesmo um poema pra explicar.




quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Desafiando Sonhos

Há pouco, meu tio me perguntou se eu não escrevo mais (gosto da idéia de ter leitores assíduos, por mais que sejam os membros da família - e olhe lá!). A verdade é que quando se entra nessa de querer ser jornalista, tem que escrever muita coisa por "obrigação", coisas nem sempre prazerosas e informais o suficiente para a subjetividade. O resultado? Acho que perdi a graça - perdi de vista, da mira. Ou apenas tirei férias, é assim que prefiro pensar. Quando se preza pelo objetivo, fica difícil o criativo. Acho que o título deste, apesar de ser devido à outra coisa, define bem a saga.

Mas falemos do assuntos empolgante. Existe uma publicação de arte bem legal que rola por Los Angeles - principalmente. É fruto da colaboração de muita gente e visa divulgar trabalhos de novos artistas e também dos já consagrados que estão por aí a fora, fazendo suas badernas. No jornal, só aparece quem é considerado importante e capaz de fazer diferença. Estou falando do The Art Street Journal.

Você, que deve estar se lamentando de morar tão longe de LA, pode abrir um sorriso e ir direto ao site dessa belezura, fazer o cadastro e esperar sua cópia na porta da sua casa. É isso mesmo, a idéia é tão legal que eles não quiseram deixar ninguém de fora e percorrem o mundo todo, porta a porta > http://www.theartstreetjournal.com/

Para o Vol. ii Issue i, colaborei com um review de Desafiando Sonhos, solo de Nina Pandolfo na Galeria Leme. Fiquei toda felizinha e por isso seguem algumas prévias do jornal para vocês, incluindo a minha participação:

MULTIPLIQUE A CULTURA